A rebelião e fuga em massa de presos do Instituto Correcional da Ilha Anchieta completa 70 anos em 2022. O fato histórico de grande repercussão ocorreu no dia 20 de junho de 1952, numa sexta-feira. O levante resultou na fuga de 129 presos, dos quais 108 foram recapturados, 15 mortos e seis tidos como desaparecidos. Durante a rebelião, oito soldados, dois policiais civis e três guardas do presídio foram assassinados.
Há inúmeros registros da rebelião, desde notícias publicadas pela imprensa da época, fotografias, documentos e relatórios das forças de segurança pública e poder judiciário, livros de memorialistas e pesquisas acadêmicas. Até o cinema já se dedicou a explorar essa história. Em 1954, dois anos depois da rebelião, foi produzido o longa-metragem “Mãos sangrentas”, um drama de ficção dirigido por Carlos Hugo Christensen.
Um grupo chamado “Filhos da Ilha” há anos se dedica a reunir pessoas que de alguma forma estão ligadas à Ilha Anchieta da época da rebelião e resgatar as histórias do passado.
Em sua pesquisa de mestrado na USP, o historiador Dirceu Franco Ferreira realizou uma leitura crítica das diversas fontes de informação disponíveis sobre a rebelião e se debruçou especialmente sobre o inquérito policial produzido pela Delegacia Especializada de Ordem Política e Social (DEOPS). A tese de mestrado do historiador resultou no livro “Rebelião e Reforma Prisional em São Paulo: uma História da Fuga em Massa da Ilha Anchieta em 1952”, publicado pela Editora Revan em 2018.
Na obra, ele descreve alguns fatores apontados pelos próprios presos em depoimentos às autoridades que os teriam mobilizado a promover o levante: “as péssimas condições de vida na Ilha, incluindo a fome, os alimentos de baixa qualidade, os constantes espancamentos e o tratamento médico precário; a venda do peixe, pescado pelos presos, pelas autoridades do presídio aos comerciantes de Ubatuba; e, por fim, as longas penas a cumprir”.
Há um capítulo em que o autor se dedica a reconstituir a evolução da rebelião e da fuga, desde seu início, com presos que trabalhavam no transporte da lenha, passando pelos ataques ao quartel, à casa do diretor, ao presídio, ao prédio da administração e às residências de funcionários. Sobre a fuga por mar, o historiador registra que foram utilizadas canoas saqueadas do Barracão da Pesca, além da lancha Carneiro da Fonte. Nessa lancha, cerca de 60 presos navegaram por 28 quilômetros até a praia de Ubatumirim, onde desembarcaram e de lá seguiram a pé embrenhando-se nas matas em direção a Ubatuba e cidades vizinhas como Paraty, Cunha, Caraguatatuba e São Luiz do Paraitinga.
“O historiador recupera fragmentos do passado, se aproxima do que aconteceu, mas não pode ter a pretensão de dizer que aquilo foi daquela forma. Então, a partir dos elementos que eu recuperei, não só do inquérito, mas também das narrativas dos memorialistas e da imprensa, é que eu consigo constituir uma narrativa”, explica Ferreira.
Três anos após o levante, em 1955, o presídio foi desativado, mas suas ruínas ainda encontram-se na ilha e podem ser visitadas no Parque Estadual Ilha Anchieta, uma Unidade de Conservação de Proteção Integral sob administração da Fundação Florestal. Para visitar o parque é preciso realizar agendamento via site de ingressos e contratar transporte marítimo junto a empresas credenciadas. Mais informações sobre visitação podem ser obtidas no site e pelos contatos (12) 3832-1397 e pe.ilhaanchieta@fflorestal.sp.gov.br
Livros para consulta na biblioteca de Ubatuba
Quem tiver interesse em ler mais sobre a rebelião, na Biblioteca Municipal Ateneu Ubatubense (Praça 13 de maio, nº 52, Centro), há oito livros de não ficção que tratam do assunto.
“O motim da Ilha Anchieta – Episódios policiais”, de 1984, escrito por Benedito Nunes Dias; “Os presidiários de Anchieta em Parati”, de 1985, escrito por A. I. De Morais Coutinho; “A Ilha Anchieta e eu”, de 1986, e “O Levante da Ilha Anchieta… e algo mais”, de 1987, ambos de Paulo Vianna; “Ilha Anchieta – Rebelião, fatos e lendas”, de 2000, e “Ilha Anchieta – O prisioneiro do pavilhão 6”, de 2005, escritos por Samuel Messias de Oliveira; “Ilha Anchieta – Memórias de um herói relegado”, de 2001, escrito por Augelani Maria Franco; e “Inferno no paraíso – O levante da Ilha Anchieta”, de 2018, do autor Lineu Roque Aceiro.
Evento
No próximo dia 25 de junho, marcando os 70 anos da rebelião, será realizado um evento no Parque Estadual da Ilha Anchieta (PEIA). Segundo cartaz encaminhado pela gestora interina, Ana Lucia Wuo, haverá programação diversa a partir das 10h da manhã, incluindo uma roda de conversa e apresentações sobre a rebelião. O evento também ocorre como comemoração ao dia municipal “Os Filhos da Ilha”, instituído por Lei no calendário oficial de eventos de Ubatuba em 2009.
Confira a programação completa:
Por Renata Takahashi / Portal Tamoios News