Em entrevista exclusiva ao Tamoios News, moradores do Reserva da Mata, condomínio de luxo na Barra do Sahy, se manifestam sobre a sentença que impôs sanções severas às construtoras e à Prefeitura de São Sebastião por crimes ambientais. Surpreendidos por um processo que desconheciam na época da compra, eles relatam o impacto de serem tratados como vilões ambientais.
Os moradores do Condomínio Reserva da Mata, um empreendimento de luxo na Barra do Sahy, São Sebastião, estão enfrentando uma batalha judicial que abalou suas vidas e expôs suas casas a um escrutínio público intenso. Em agosto de 2024, uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou as construtoras responsáveis pelo condomínio e a Prefeitura de São Sebastião por crimes ambientais, impondo sanções que incluíram uma multa de R$ 500 mil, a restauração das áreas de preservação degradadas, a anulação do alvará de construção e a suspensão das atividades comerciais no condomínio até a conclusão das obras de recuperação ambiental.
Apesar de terem adquirido suas casas com base em documentos e autorizações emitidas pelas autoridades competentes, os moradores foram surpreendidos ao descobrir mais detalhes do processo judicial. O processo foi iniciado em 2015, e os proprietários tomaram conhecimento do processo por volta de 2017, quando a maioria das unidades já havia sido vendida. Pela primeira vez, eles falam à imprensa sobre o impacto dessa decisão, revelando o choque e o sentimento de injustiça que permeiam a comunidade.
O Sonho de Ter uma Casa na Praia e a Surpresa do Processo
Edinalvo de Jesus, 63 anos, síndico do condomínio e um dos principais porta-vozes dos moradores, explica que a obra do condomínio começou em 2013, quando 14 unidades foram vendidas, e as demais foram comercializadas até 2016. Todos os documentos indicavam que o empreendimento estava em conformidade com a lei. “Os projetos executivos foram aprovados pela Prefeitura de São Sebastião, a incorporação estava registrada no cartório, e a obra foi embargada por não atender ao recuo de 50 metros da margem do Rio Sahy. Entretanto, após a apresentação da documentação que comprovava a regularidade e a retificação do projeto, o embargo foi retirado, e a obra continuou a ser executada,” detalha Edinalvo.
Ele destaca que, entre as aprovações recebidas, estavam o alvará de construção e o “Habite-se”, que atesta que a obra foi concluída conforme as normas vigentes, além das outorgas de captação de água da serra, as licenças para canalização de águas e as matrículas individualizadas no cartório. Segundo Edinalvo, esses documentos representavam uma garantia de que tudo estava em ordem, transmitindo segurança aos compradores. “Ficamos surpresos, com todas as autorizações regulares, ainda temos que ficar nos defendendo de acusações,” lamenta Edinalvo, que expressa a frustração de quem acreditava estar seguindo todas as normas estabelecidas.
Os moradores relatam que foram pegos de surpresa quando souberam da existência do processo judicial, que já tramitava desde 2015. Segundo Edinalvo, muitos compradores só souberam das disputas legais em torno de 2017, mesmo após terem adquirido suas propriedades, já que o processo não estava amplamente divulgado na época. “Não poderíamos ser informados de irregularidades que não existem”, afirma o síndico, ressaltando que todos agiram de boa-fé, baseados nas aprovações e nas garantias oficiais.
Detalhes das Autorizações e Licenças
A confiança dos moradores se baseava em uma série de documentos emitidos pela Prefeitura e registrados nos cartórios. Edinalvo explica que os projetos executivos, aprovados pela Prefeitura de São Sebastião, foram fundamentais para que o empreendimento avançasse. A incorporação registrada no cartório confirmava a regularidade do condomínio, e as outorgas de captação de água da serra e de canalização das águas ofereciam as garantias ambientais necessárias. “Essas aprovações eram essenciais para nós. Sem elas, não teríamos comprado nossas casas,” ressalta Edinalvo.
Ele menciona também que o alvará de construção e o Habite-se garantiam que a obra foi concluída conforme as especificações aprovadas pelas autoridades. Além disso, Edinalvo destaca que as aprovações do CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) e as outorgas concedidas pelo DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica) eram fundamentais para a legalidade do empreendimento, uma vez que permitiam a captação de água e outras intervenções em cursos d’água.
Para Edinalvo e os moradores, esses documentos representavam muito mais do que simples aprovações burocráticas; eram a base de sua confiança no investimento. “Acreditamos que compramos dentro da lei,” enfatiza Edinalvo, sublinhando que as ações dos moradores sempre foram pautadas pelo cumprimento das normas legais. A sensação de terem sido enganados pelas garantias oferecidas pelas autoridades públicas se tornou um ponto central na narrativa dos proprietários.
Conflito com a Sociedade Amigos da Barra do Sahy (SABS)
O processo judicial também gerou um conflito significativo com a Sociedade Amigos da Barra do Sahy (SABS), que se posicionou como amiga da corte durante a ação movida contra o condomínio. Muitos moradores do Reserva da Mata são associados da SABS e esperavam que a entidade defendesse o interesse da comunidade de forma abrangente. No entanto, a atuação da SABS como parte ativa no processo trouxe à tona uma tensão que já vinha se formando.
Em uma mensagem enviada ao grupo da SABS, Edinalvo expressou o descontentamento dos moradores com a postura da associação. A carta, reproduzida abaixo na íntegra, evidencia a insatisfação dos moradores e levanta sérias questões sobre o papel da SABS na defesa dos interesses da comunidade:
Carta de Edinalvo de Jesus à Sociedade Amigos da Barra do Sahy (SABS):
“Senhores, sim, vamos recorrer até onde for possível, pois eu mesmo, Edinalvo de Jesus, fiz tudo dentro da Lei para ter esse condomínio dentro da Lei. Entendo, como comprador de boa fé, que tenho esse direito. Se meu condomínio infringiu a lei, vamos pagar por isso, mas não tenham dúvida que, custe o que custar, vou atrás daquele que se acoberta de paladino da justiça, questionando aos órgãos públicos e ao judiciário se todos os empreendimentos, sejam casas ou condomínios, cumpriram as exigências legais para suas construções. Existem casas e outros empreendimentos que estão dentro do rio, e nada a SABS fez para regularizar essa situação. A demanda ainda não acabou e quero que tudo seja resolvido dentro da Lei e que nenhum infrator deixe de ser punido, se culpado for. Obrigado e vamos em frente, e que o Grande Arquiteto do Universo, que é Deus, a todos ilumine e guarde.”
Após a leitura da carta, Edinalvo foi questionado sobre o que os moradores esperam alcançar com o recurso judicial. Ele respondeu: “Queremos viver em paz e aproveitar nossas casas sem sermos importunados. É frustrante que, com todas as autorizações regulares, ainda tenhamos que nos defender de acusações.” Essa declaração destaca o desejo dos moradores de ver suas vidas e suas propriedades protegidas das repercussões negativas da decisão judicial.
Edinalvo também foi perguntado sobre outros empreendimentos na região que deveriam ser avaliados. Ele afirmou: “Com base nos argumentos que foram usados para nos condenar, acredito que outros empreendimentos residenciais, comerciais e casas também devem ser chamados a prestar contas sobre suas construções, tanto em relação à autorização da Prefeitura quanto dos órgãos ambientais.”
Além disso, ele criticou a inação da SABS em relação a construções que, segundo ele, não estão em conformidade com as leis ambientais. “A casa que fica ao lado da ponte, por exemplo, está quase dentro do rio, e não tenho conhecimento de que a SABS tenha questionado ao Ministério Público e aos órgãos de meio ambiente se essa edificação está de acordo com a lei,” destacou.
Essas declarações refletem um profundo sentimento de injustiça entre os moradores, que se veem como vítimas de um processo que não esperavam. Para Edinalvo, o condomínio se tornou um bode expiatório, enquanto outras infrações, em sua visão, passaram despercebidas ou foram ignoradas pela associação. Essa crítica à SABS não apenas expressa a frustração dos condôminos, mas também ressalta a importância de uma atuação mais equitativa em relação a todas as construções na região.
A Exposição Pública e o Impacto na Vida dos Moradores
Para os moradores do Reserva da Mata, a exposição pública do caso trouxe não apenas desafios legais, mas também um impacto emocional profundo. De compradores de boa-fé, eles passaram a ser vistos como vilões ambientais pela opinião pública, situação que, para Edinalvo, é profundamente injusta. “Ficamos surpresos e frustrados,” desabafa o síndico, destacando o desgaste emocional e social de serem responsabilizados por questões que não foram comunicadas a eles na época da compra.
A narrativa pública transformou o condomínio em um símbolo de desmatamento e degradação, colocando os moradores em uma posição desconfortável de defesa contínua. Para Edinalvo, a batalha que eles enfrentam agora não é apenas nos tribunais, mas também pela recuperação de suas reputações e pelo reconhecimento de sua boa-fé. “Acreditamos que estávamos fazendo tudo certo, e agora pagamos por algo que não sabíamos,” comenta, ressaltando a frustração de ver suas intenções distorcidas.
Conclusão: O Caminho Adiante
Enquanto recorrem das decisões judiciais, os moradores do Reserva da Mata buscam que a Justiça reconheça sua posição como compradores que confiaram nas licenças e autorizações emitidas pelas autoridades competentes. Para Edinalvo e os outros proprietários, o foco é corrigir as injustiças que sentiram ao serem tratados como responsáveis por danos ambientais que acreditavam estar evitando ao seguir todas as exigências legais.
A história do Reserva da Mata, na visão de seus moradores, é um exemplo das consequências das falhas nas concessões de licenças e na comunicação de processos que afetam diretamente a vida de quem age de acordo com as normas. Para eles, o objetivo é que suas ações sejam vistas pelo que realmente foram: a realização de um sonho legítimo, abalado por uma realidade jurídica desconhecida. A luta agora é para que o direito de viver sem o peso da culpa seja garantido, enquanto buscam resgatar a confiança perdida em um sistema que, segundo eles, falhou em protegê-los.
Por jornalista Poio Estavski