Por Salim Burihan
A cidade de Caraguatatuba perdeu nesta quarta-feira(3) um dos seus mais queridos comerciantes, o libanês Ali Hussein Yaktine, que era carinhosamente chamado de “primo Ali”. A causa da morte não foi informada.
Ali, de 80 anos, não será sepultado no Brasil, onde vivia há quase 60 anos. Segundo sua neta Amanda, ele será sepultado no Vale do Bekaa, no Líbano, seu país de origem, conforme era o seu desejo.
O Vale do Bekaa é uma área de produção agrícola, habitada por vários brasileiros de origem libanesa, que costumam voltar ao Líbano quando se aposentam ou para passear.
Ali após fechar sua loja Móveis Ouro Verde, em Caraguatatuba, no início dos anos 2.000, começou a passar vários meses por ano no Líbano.
Alegava que não podia deixar suas duas irmãs, primos e sobrinhas sozinhas no terrível conflito armado que o país vivia.
“A questão não é não querer sair. Tenho duas irmãs aqui, tenho primas, sobrinhas. Está na hora de mostrar o sentimento de lealdade e apoio. É por isso que fico com minha família”, diz Yaktine em entrevista concedida em 2006 a DW-WORLD.
Esse era também o seu espírito solidário no Brasil, especialmente em Caraguatatuba, para onde se mudou na década de 70 com a então mulher Mércia e as filhas.
Ali chegou a Caraguatatuba após ser comerciante em São José dos Campos. Ele montou a sua primeira loja na rua Santa Cruz, onde hoje é o calçadão. Morava nos fundos da loja, com a família.
Graças ao seu carisma, receptividade e solidariedade com seus clientes, cresceu rapidamente e construiu a Móveis Ouro Verde onde hoje está situada a Lojas Americanas.
Era um comerciante diferenciado no trato com seus clientes. Ninguém deixava a loja sem levar o que queria. O “primo Ali” atendia os desejos e os sonhos de todos que entravam na loja.
O pagamento era super facilitado, não tinha como não levar o que se pretendia comprar. E Ali entregava tudo na casa do cliente. Moradores de Caraguatatuba e das cidades vizinhas eram clientes frequentes de sua loja.
O então comerciante foi pioneiro nos shows de prêmios. Um super sorteio que realizava anualmente e cujo encerramento era feito com a presença e shows de artistas do rádio e da TV, atraindo milhares de pessoas, devido a transmissão ao vivo feito pela Rádio Oceânica.
Pode se dizer, sem erro, que toda a população da cidade, na época, fazia compras em sua loja. Ali e sua então esposa Mércia eram convidados para serem padrinhos de batismo ou de casamento de muitos moradores. Muitos veranistas também compravam em sua loja, atraídos pelos bons preços e pelo gentil atendimento de Ali.
De 1975 a 1977, Ali Yaktine presidiu a Associação Comercial de Caraguatatuba. Graças ao trabalho e incentivo dele, a cidade valorizou e resgatou a Banda Municipal Carlos Gomes e viu nascer a sua primeira escola de samba, a “Tubarão”, da dona Eleonor comandada pelo inesquecível “mestre Dionísio”.
Ali ajudava todas as pessoas que podia, famílias carentes, asilos, igrejas, entidades assistenciais, de classe e times de futebol amadores. Foi inúmeras vezes cogitado para ser candidato a prefeito afinal era considerado um dos principais comerciantes da cidade e região, mas nunca quis disputar o cargo.
Nas eleições municipais, recebia todos os candidatos em sua casa e comércio, com o mesmo carinho e atenção, mas procurava-se manter isento nas disputas. Nos últimos anos, passava mais tempo no Líbano que aqui no Brasil, onde parte de sua família ainda vive. Apesar de ser um comerciante de muitas posses, Ali Yaktine sempre foi um homem humilde e simples, não gostava de ostentações e poucas vezes participou de eventos sociais.
O prefeito Aguilar Junior lamentou a morte de Ali Yaktine. “Neste momento onde empresários são motivados a inovar o jeito de vender, perdemos o comerciante que deu aula de inovação em nossa cidade. Muitas casas em Caraguá ainda são decoradas com artigos da loja “Móveis Ouro Verde”, e nos lembramos constantemente da torcida pelos prêmios de final de ano que eram sorteados. Ali Yaktine, nos deixa hoje com a lição de que uma empresa pode crescer com as mudanças e transformar os desafios em oportunidades. Meus sentimentos à toda família! “, postou o prefeito em sua página nas redes sociais.
Ainda Guardo na memória uma de nossas conversas, no ano de 1987, palavras que jamais me esqueci. Ali sabia que minha família era de Hasbaya, no sul do Líbano, próximo a Beirute e me convidou para ir com ele em sua viagem ao país. Eu recusei o convite devido ao trabalho. Sentado em seu escritório, na loja, Ali pegou um papel e fez um desenho, um retângulo, que significava um caixão e em seguida, emendou, “Primo, no caixão não cabe nada, só o corpo de quem morre. Tudo que conquistar vai permanece por aqui, não tem como levar. Aproveite a vida”.
*Siga com as bençãos de Deus, meu amigo e padrinho…