A Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SAP/Mapa) cancelou edital que previa a cessão de faixas marítimas em São Paulo para a criação de peixes e mariscos em larga escala. A medida atende a uma recomendação do Ministério Público Federal (MPF) pela proteção das áreas situadas no litoral Norte paulista. Ao acatar os pedidos do MPF, a pasta confirmou que eventuais novas licitações desse tipo somente serão lançadas após consulta aos grupos caiçaras que habitam a região e aos gestores da unidade de preservação marinha ali existente. Nesses casos, se a comunidade tradicional e as autoridades ambientais considerarem a exploração econômica proposta incompatível com os usos sustentáveis dos espaços, as áreas deverão ser excluídas do objeto de cessão.
A recomendação foi expedida em outubro do ano passado. No documento, o MPF alertava para a ausência de consulta prévia à comunidade caiçara que há mais de 100 anos exerce atividades de subsistência nas praias locais e que poderia ser diretamente afetada pela exploração comercial indicada no edital 02/2020 da SAP/Mapa. Normas nacionais e compromissos internacionais assumidos pelo Brasil asseguram que povos tradicionais suscetíveis aos efeitos de medidas legislativas e administrativas sejam ouvidos a respeito de sua implementação.
Além de desrespeitar essa obrigação, a SAP/Mapa passou por cima dos órgãos ambientais ao lançar o edital sem consultá-los sobre os impactos que a cessão dos espaços traria. A prática da aquicultura poderia colocar em risco a Área de Proteção Ambiental (APA) Marinha do Litoral Norte de São Paulo, gerida pela Fundação Florestal, e cujo plano de manejo está em fase de conclusão. A unidade tem elevada importância biológica e é estratégica para a preservação da biodiversidade brasileira, situando-se na confluência de três dos cinco ecossistemas considerados patrimônios nacionais na Constituição Federal: a Mata Atlântica, a Serra do Mar e a Zona Costeira.
A Secretaria de Patrimônio da União (SPU), outra destinatária da recomendação, também manifestou o acatamento integral dos pedidos do MPF. Segundo o compromisso assumido pelo órgão, a regularização de qualquer cessão de áreas marinhas para a implementação de atividades econômicas como as previstas no edital 02/2020 somente poderá ser realizada após a SAP/Mapa demonstrar a realização das consultas prévias indicadas.
O MPF destaca que a conservação ambiental é compatível com a existência dos grupos tradicionais na região e que a APA Marinha Litoral Norte reconhece a presença deles e suas práticas sustentáveis de subsistência. “A consulta prévia às comunidades que fazem uso tradicional das áreas a serem cedidas, bem como à Área de Proteção Ambiental Marinha do Litoral Norte, é fundamental para que se garanta o desenvolvimento sustentável, com respeito ao modo de vida e aos recursos ambientais necessários à subsistência das comunidades caiçaras e à preservação do sensível e relevante ecossistema da Zona Costeira”, afirmou a procuradora da República Maria Rezende Capucci, autora da recomendação do MPF.
*Fonte: Ministério Público Federal em São Paulo