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Crônica: Chega de mimimi

Tamoios News

Não me venham com mimimi, o Brasil tem uma dívida histórica com os negros, não só pela escravidão, mas pela segregação que continua por todos os séculos e séculos amém.
Somente com as cotas os afrodescendentes puderam chegar as universidades de verdade, mas a quantidade de jovens negros que são mortos por engano, escancaram que na verdade
sobreviver está cada vez mais difícil.

Minha mãe Beatriz Puertas escreveu sobre isso, falou que quando a abolição chegou, foi para os netos, e eu concluo dizendo que todas as políticas públicas para os afrodescendentes
chegam tarde.

Lamento do Escravo 

Obrigada, liberdade,
neste raiar de dia,
embora que para esta carcaça negra,
já tenhas chegado tardia!
Com as correntes nas pernas
jogados no navio negreiro,
vínhamos como animais,
eu e meus companheiros.
Nosso corpo depido de roupas,
só coberto com um pedaço de pano,
mas em nossos peitos de macho,
o orgulho do povo africano.
Humilhados começamos a luta
de obedecer e trabalhar,
mas na cabeça de cada um,
o sonho de um dia voltar.
Muitas chibatadas no lombo,
sol, e chuva também,
cabeça baixa para o Coronel,
mas respeito de ninguém.

A minha fêmea era linda,
um presente de Deus,
mas um dia o Coronel a levou, para
a Casa Grande, e ela desapareceu.
Não a vi mais nas janelas,
na varanda ou no terreiro,
eu acho que depois de sugá-la,
o algoz a trocou por dinheiro.
Sempre nas noites de chuva,
no chão da Senzala umedecida,
o meu coração chora triste,
saudoso da minha querida.
Hoje estamos livres,
mas não posso procurar,
minhas pernas que eram fortes, agora,
se arrastam, eu não posso caminhar.
A liberdade é fruto doce,
que já não posso comer,
meus dentes se foram com o tempo,
amargo ficou meu viver.
Muitos anos se passaram, desde
que aqui cheguei para trabalhar,
nesta terra deslumbrante,
que eu até aprendi a gostar.
Encarquilhado no meu canto,
só fico olhando o festim,
batendo palmas para os netos,
pois a festa não é mais para mim.

Beatriz Puertas de Moura

Texto da jornalista e escritora  Maria Angélica de Moura Miranda