Em cada cidade, bairro e rua, mulheres ocupam diferentes postos de trabalho, escrevem caminhos, traçam seus dias e lutam por melhores condições. Neste dia 8 de março, não querem só flores ou bombons, querem respeito
Paulina acaba de terminar a reunião online da ‘Liga das Mulheres pelo Oceano’. “Esse período da pandemia restringiu muito os trabalhos das mulheres, são tantas ideias, tanta gente boa reunida, não vejo a hora de ter todo mundo em um encontro presencial e colocar mais coisas para andar”. Eram 10h15 e a empresa de mudanças/carretos estava para chegar, Amanda, das irmãs Trindade, foi indicada por amigas da região, por ser muito cuidadosa com o trabalho. Aguarda também o atendimento da seguradora para fazer a chave do seu carro, que por passe de mágica havia perdido, certamente na arrumação da mudança. Olha pela janela e lá está chegando Cida, a chaveira, para resolver seu problema. Seu telefone toca e a marceneira Elizabete conta que já entregou na casa nova, as cômodas, mesas de cabeceira e baús. Enquanto espera a motorista Fabiana que irá levá-la para Ilhabela, lê uma notícia da Fundação CASA em Caraguatatuba, que é dirigida por uma mulher, Luciana.
‘Mulher pode ser o que quiser, onde quiser e na hora que quiser’, disse Ana Marcela Costa, após ganhar a medalha de ouro na maratona aquática nas Olimpíadas de Tóquio, em agosto de 2021. A frase da atleta resume a luta das mulheres por reconhecimento, investimento, igualdade, autonomia e independência. Com essa frase, abre-se um panorama amplo de histórias de mulheres diferentes entre si, cada uma com sua luta, conquistas, trabalho, bandeira e muita, mas muita dedicação.
E em cada país, cidade, bairro e rua, mulheres ocupam lugares e postos de trabalho, escrevem diferentes caminhos, traçam seus dias com suas famílias, estudos, ideais, sejam elas mães, esposas, marceneiras, chaveiras, motoristas particulares; as que fazem carretos, que são diretoras de centros socioeducativos de adolescentes masculinos ou integram uma liga de mulheres que estão preocupadas em preservar o mar para as futuras gerações, além de terem suas profissões.
Todas estão construindo seus projetos de vida baseados em necessidades, metas e sonhos, alicerçando e criando uma realidade melhor com apoio de seus parceiros ou trilhando um caminho solo, trabalhando no presente com foco no futuro, com sensibilidade, delicadeza e firmeza. Porque podem. Elas contam que não desistem nunca. São mulheres fortes, que podem ser o que quiserem. Sempre.
“A marcenaria entrou na minha vida há algum tempo. Sou divorciada, tenho quatro filhos, uma neta e sempre gostei de artesanato. Devido a uma cirurgia na cervical e sem poder trabalhar por quase três anos, resolvi fazer cursos de paletes para ajeitar a minha casa”. Então descobriu que queria mais, conhecer esse mundo, trabalhar com madeiras pesadas, dar vida a elas. Comprou maquinários e hoje produz cômodas, mesas de cabeceira, prateleiras, baús. “Amo o que faço. Compensa ver o meu trabalho reconhecido. As pessoas acham diferente eu ser marceneira, é um trabalho pesado e valorizam. Sou ambidestra, tive um acidente e hoje consigo trabalhar com as duas mãos, eu renasço todo dia. Nós somos capazes, nós podemos. Temos que sonhar e realizar. Há muitas mulheres que se esqueceram de sonhar e deixaram outras pessoas sonharem por elas. Somos uma coluna. Temos que estar em pé”, afirma Elizabete Augusto da Silva, 47, marceneira, mora em Caraguatatuba.
Cida Martins, 46, está de mudança para o Litoral Norte. Vivia em Ferraz de Vasconcelos – SP e trabalha para uma seguradora. Ela é chaveira, aquela pessoa que quando alguém perde a chave do carro ou da casa é o profissional mais esperado. “Só que exerço uma profissão masculinizada e isso tem seus prós e contras, às vezes chego e sou mal recebida: Nossa, uma mulher?”.
Ela conta que o melhor é quando termina o atendimento, resolve o problema e tem a certeza de mostrar que o fato de ser mulher não a difere dos homens. “Eu posso fazer as mesmas coisas que eles fazem. Isso é quase um cala a boca para os clientes que desacreditam ou têm qualquer preconceito. Já me senti um pouco deslocada com um ou outro colega de trabalho, mas é tudo experiência. Aprendi o básico do meu ofício com meu ex-marido, era a sua profissão. Quando me separei, segui nessa área”. Cida é integrante do Clube de Motociclistas Barba Negra’s e nas folgas, curte a estrada em sua moto. “Eu sempre corri atrás dos meus objetivos. Não tenho sonhos, tenho metas. Podemos ser o que quisermos, então, mulheres, corram atrás do que almejam”, indica.
Amanda Trindade, 36, quatro filhos, motorista do ramo de transportes em São Sebastião, conta que há quatro anos, antes de ter a caçula, também ‘puxava’ barrilha dentro do porto. “Gosto do trabalho mais pesado, de trabalhar com caminhão. Eu só não estou na estrada porque meus filhos me seguram em casa. Mas eu gosto muito. Sou confundida com homem, dão ‘bom dia, campeão’ e depois veem que é uma moça, mas sou muito bem aceita na minha área, nunca me senti insegura por fazer meu serviço. Amo minha profissão”, conta.
“Minha profissão veio do meu pai, no ramo dos transportes. Ficamos mais independentes, até que eu e minha irmã conseguimos conquistar nosso caminhãozinho, somos motoristas e organizamos a mudança. Somos bem aceitas pelos clientes, muito cuidadosas e bem organizadas com os móveis para não danificar nada. Nos conhecem como as Irmãs Trindade”.
Fabiana Lourenço, 54, separada, tem uma filha casada, é formada em turismo e vive em Caraguatatuba. Depois de procurar e não encontrar posição em sua área foi para o ramo de transportes, como motorista particular de aluguel e prioriza o atendimento às mulheres. Já havia trabalhado de motorista para uma família, levando os filhos em escolas, cursos, festas, mas mudou-se para o litoral e já está há um ano nessa função. “Percebi que havia uma oportunidade de ser motorista para mulheres ouvindo minha família e amigas que todas se sentiriam mais seguras com uma mulher, ao invés de um homem conduzindo em um serviço. Já havia pensado em focar em transporte para idosos, mas percebi que atender o público feminino era um serviço inovador e há muita clientela. Mas atendo famílias também, levo para compras, viagens, consultas médicas”.
Sobre ser mulher e estar nesse serviço, no início se sentiu pressionada, talvez por outros motoristas na área, mas não se intimidou. “Eu ignorei e segui em frente. Nós mulheres somos mais do que vencedoras e estamos conquistando nosso espaço a cada dia. Não devemos abaixar a cabeça para nenhum tipo de preconceito e no Dia das Mulheres, não queremos bombons ou flores, queremos é que nos respeitem como somos”, ponderou.
“Trabalho em um ambiente prioritariamente masculino, tenho mais de 30 homens sob meu comando, desses 30, são seis coordenadores de segurança, fora os internos do sexo masculino, que são mais 30. Todas as ações são tomadas conjuntamente, de forma democrática, mas a decisão final é minha”, conta Luciana Guagliano de Lucca, 50, casada, sem filhos, diretora da Fundação CASA de Caraguatatuba.
“Mas com postura, a figura de autoridade aliada à sensibilidade, o olhar feminino, conseguimos um equilíbrio no ambiente de trabalho, procuramos manter a equipe leve. Não é um ambiente normal de se trabalhar, é um trabalho diferenciado. No sistema socioeducativo passamos por situações limites, graças a Deus isso não acontece desde que estou à frente da direção”. Ela está na instituição há 10 anos, mas já foi vice-diretora em escolas, trabalhou em bancos e comenta que tornar o ambiente mais equilibrado e mais leve faz parte da mulher, mas que isso não isenta a gente de às vezes falar grosso. “Mas sou muito respeitada. Lá os homens têm esse respeito pela figura feminina, não tem problema nenhum serem comandados por uma mulher e são 60 sob minha responsabilidade”.
Segundo ela, que não é muito comum ter mulheres nesse universo, inclusive é uma árdua missão, num universo masculino equilibrar a delicadeza com os procedimentos de segurança. “Na Divisão do Vale do Paraíba e Alto Tietê, que abrange as unidades da Fundação CASA, por exemplo, eu em Caraguatatuba, uma colega em Taubaté, a nossa Diretora Regional e a Encarregada da Área da Segurança! Temos que provar o tempo todo que a autoridade e a firmeza das decisões podem ser sim, acompanhadas pela delicadeza e feminilidade”.
Ela faz parte de um moto clube, seu marido é presidente desse grupo. “É um ambiente masculino, não ando na garupa, tenho a minha moto e viajo com eles. Minha vida é próxima dos homens e acho que o olhar das mulheres são acolhedores e busco estar em equilíbrio, faço meditação, corro, vivo uma vida normal e vou trabalhar de moto. Chego, guardo o capacete, troco de roupa e sou a diretora da Fundação CASA. A força de trabalho das mulheres é muito importante para a sociedade”, finaliza.
Se você quiser contratar os serviços das mulheres citadas nesta reportagem, entre em contato:
Amanda Trindade – Carretos, mudanças – (12) 981426944
Cida Martins – Chaveira – (11)971351874
Elizabete Augusto da Silva – Marceneira, artesã – (12) 983178693
Fabiana Lourenço – Motorista particular – (19) 981898394
Texto: Adriana Coutinho/Tamoios News