O Ministério Público de Contas de São Paulo propôs emissão de Parecer Prévio desfavorável às contas da Prefeitura Municipal de São Sebastião, referentes ao exercício de 2023. O documento, assinado pelo Procurador de Contas Dr. Rafael Neubern Demarchi Costa, apontou “ineficiência qualitativa, evidenciada por uma série de graves falhas que comprometeram a qualidade dos serviços públicos”.
O parecer analisou o sétimo ano de mandato do Prefeito Felipe Augusto, que apresentou um quadro de reincidências e irregularidades que vêm se acumulando ao longo da gestão.
Para o Procurador, a administração municipal “não se apresentou dentro dos parâmetros legais e dos padrões esperados”, frustrando “o dever de busca da máxima eficácia dos direitos fundamentais”.
A avaliação do Índice de Efetividade da Gestão Municipal (IEG-M), confirma esse diagnóstico: desde 2018, São Sebastião mantém classificação global “C”, indicador de baixo desempenho, denotando políticas públicas locais com efetividade reduzida.
Além disso, uma série de falhas orçamentárias e contábeis afetou a transparência e a confiabilidade da gestão fiscal. Uma das mais graves foi a omissão de mais de R$ 181 milhões na contabilização de royalties do petróleo recebidos judicialmente. Embora o Município tenha efetivamente recebido R$ 1.091.940.806,41, apenas R$ 910.755.269,86 foram registrados nos balancetes.
“A omissão de valores dessa magnitude compromete a fidedignidade das demonstrações contábeis, afronta os princípios da transparência e evidenciação contábil, e prejudica o exercício do controle externo”, alertou o Procurador.
E não foi só. Verificou-se a ausência de metodologia de cálculo para projeção das receitas advindas de royalties de petróleo e a fixação de despesas em patamar incompatível com o histórico de arrecadação. Tal conduta resultou em remanejamentos e créditos adicionais que ultrapassaram 110% do orçamento inicial, o que “fragiliza a credibilidade do planejamento fiscal como instrumento de gestão responsável”.
Na área da Educação, o Ministério Público de Contas destacou precariedades nas instalações físicas das escolas, falta de manutenção predial e preocupante desvalorização dos profissionais do magistério. O déficit de vagas em creches também foi mencionado: enquanto 178 crianças seguiam em fila de espera, a Prefeitura de São Sebastião destinou R$ 6,979 milhões para etapas de ensino médio e superior — uma prática proibida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
“Destaca-se que o não atendimento das crianças nos estabelecimentos de ensino caracteriza omissão administrativa que desafia direito social garantido pela Constituição Federal, bem como pela legislação dela derivada, além do princípio da prioridade absoluta à criança”, frisou o titular da 1ª Procuradoria de Contas.
O parecer ressaltou ainda que essa destinação indevida de recursos “configura crime de responsabilidade, conforme o artigo 208, parágrafo 2º, da Constituição Federal”, motivo pelo qual o Procurador propôs que o caso seja comunicado ao Ministério Público.
Da mesma forma, o cenário da Saúde municipal se manteve crítico. De acordo com o relatório elaborado pela auditoria do TCESP foram verificados falta de plano de carreira para os profissionais da área, desabastecimento de medicamentos, deficiências estruturais nas unidades de atendimento e número insuficiente de equipes de saúde da família. Constatou-se longas filas de espera por consultas e exames especializados, como 1.268 pacientes aguardando atendimento oftalmológico, 89 esperando por nasofibroscopia e 84 por avaliação urodinâmica.
Para o Dr. Neubern, “a concretização dos direitos sociais à Saúde e à Educação não se restringe ao cumprimento da regra constitucional de gasto mínimo, posto que é preciso garantir que tal patrocínio seja acompanhado de qualidade efetiva”.
Outro ponto sensível reportado no parecer ministerial é a omissão do Município em ações de proteção e defesa civil. Mesmo ciente da existência de áreas de risco mapeadas desde 2018 pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), a Prefeitura de São Sebastião não destinou recursos específicos nem adotou medidas preventivas, descumprindo o que determina a Lei 12.608/2012.
Essa inércia, afirmou o Procurador, “contribuiu para o agravamento do desastre ocorrido em fevereiro de 2023”, quando deslizamentos de terra causaram 64 mortes, além da destruição de moradias, escolas e outros equipamentos públicos. Mais de um ano após o episódio, vistorias constataram que resíduos e entulhos ainda permaneciam em áreas habitadas, revelando morosidade nas ações de resposta e reconstrução.
O parecer também questionou o gasto de R$ 4,785 milhões do tesouro municipal com a contratação de shows artísticos. Embora o lazer seja um direito social, o representante ministerial observou que “é preciso avaliar a pertinência dessas despesas diante das carências persistentes em setores essenciais como saúde, educação e defesa civil”.
A fragilidade do controle interno é outro problema recorrente. Em 2023, o setor contava com apenas um servidor comissionado, e os relatórios sequer eram encaminhados ao Chefe do Poder Executivo.
“A ausência de uma atuação eficiente desse sistema compromete a governança pública e a efetividade das ações administrativas”, avaliou Dr. Rafael Neubern, destacando que, se o controle interno estivesse atuante conforme prevê o artigo 74 da Constituição Federal, “grande parte das falhas poderia ter sido evitada”.
Diante do conjunto das ocorrências, o Ministério Público de Contas opinou pela emissão de Parecer Prévio desfavorável às contas de 2023 da Prefeitura de São Sebastião, propondo aplicação de multa ao gestor e comunicação ao Ministério Público da Comarca local sobre diversos apontamentos, como o direcionamento irregular de recursos para desapropriações sem comprovação de destinação pública, as irregularidades em licitações e contratações com indícios de sobrepreço, o uso inadequado de recursos públicos para eventos artísticos, entre outros.
Acesse AQUI o parecer ministerial.
Fonte: MPC



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