População contesta a escultura no local e questiona necessidade de reforçar passagens tristes da história
Por Adriana Coutinho
A tradicional Praça da Bíblia em Caraguatatuba foi revitalizada e será entregue à população nesta quarta-feira (22), às 18h. Com novo piso, bancos e paisagismo, entre outras, a estrutura monumental foi restaurada e o acesso ao púlpito recebeu pergaminho com passagens bíblicas. Para isso, o investimento foi próximo a R$ 145 mil.
Além das benfeitorias, a praça recebe também um monumento em homenagem às vítimas da catástrofe de 1967, o que tem causado estranheza na população. Alguns apontam que misturou duas situações – a religiosa e a histórica, sendo a última, motivo de tristeza para muitas famílias da cidade.
Caraguatatuba já possui um monumento à catástrofe, produzido durante a Administração de José Pereira de Aguilar, em 2008, que fica no Cemitério Municipal. Idealizada na época, pelo arquiteto Mauro Apingorá, a obra é composta de vários troncos de árvores.
“Foi tanto sofrimento, as pessoas perderam famílias inteiras. A gente devia comemorar passagens e lembranças boas e não fazer uma obra que faz a gente ficar triste. Ficou bem real, o artista é bom, mas a ideia não foi boa” – comenta uma moradora que não quis se identificar.
Alguns comerciantes e moradores do entorno da praça também são contrários quanto à colocação da obra no local, já que bem ao lado está a Praça do Radioamador – A cidade ficou incomunicável no dia 18 de março de 1967, por conta da catástrofe e foi salva por Thomaz Camanis Filho, radioamador homenageado no local. Acham que seria natural a escultura estar lá, adequado para o tema.
Jair, 58, autônomo, é morador de Paraibuna e observa a obra que o remete à tristes lembranças – “No dia da catástrofe fiquei muito preocupado pois tinha familiares que moravam aqui. Achei a obra muito real, o artista está de parabéns, mas não entendi muito bem, pois misturou um pouco. Fiquei surpreso pois aqui é a Praça da Bíblia” – comenta.
Segundo o arquiteto Wandemberg Naves, ele recebeu da Prefeitura a missão de entregar uma escultura que recriasse a histórica cena das inúmeras pessoas que conseguiram se salvar da catástrofe em troncos de árvores. Com cinco metros de comprimento e esculpida em pinho e amendoeira, está sustentada por suportes também em madeira e pedra, que remetem a uma cruz. A obra custou aos cofres públicos R$14.445 reais, entre o valor pago ao artista, o custo da madeira, transporte, acabamento e instalação no local.
O autor da escultura é Giulio Adriano Andreotti, 37 anos, artesão conhecido por “Cupim”, caiçara nascido em Ubatuba. Vive em Caraguá há 20 anos, trabalha com entalhe em madeira há mais de 18 anos e conta que fez a obra com amor, pois sua familia morava na cidade na época da catástrofe.
“Sei que é uma cena forte, a peça é bem realista e impactante, com detalhes nos rostos. Traz à memória momentos de dor e sofrimento, mas fiz conforme a encomenda. Teve um dia enquanto estava entalhando, eu trabalho em frente à minha casa, passou um senhor de bicicleta, parou ficou olhando e saiu chorando. A obra está pronta desde fevereiro, era para ter sido feita a homenagem em março, mês da catástrofe, mas parece que não deu certo, a praça passou por uma reforma” – conta o artista.
A Praça – A Praça da Bíblia foi inaugurada em 20 de abril de 1988, durante o 131º aniversário da cidade. O monumento à Bíblia é uma concepção do arquiteto De Carlo, que na época atendia na Divisão de Engenharia e Urbanismo da prefeitura.
O simbolismo de sua criação consiste pelo círculo central que representa o mundo; os arcos que se unem ao centro significam a Trindade de Deus: Pai, Filho e Espírito Santo. Dessa união ao centro surge uma Luz que ilumina a Bíblia, a palavra de Deus e, o Sagrado Livro, na época foi feito de mármore.