Um grande segredo da política caraguatatubense vai completar 56 anos este ano. Em julho de 1963, os vereadores se reuniram, as portas fechadas, em uma sessão secreta. Foi uma reunião tensa e duradoura. O motivo daquela reunião permanece até hoje desconhecido. A ata da reunião, assinada por todos os vereadores, foi lacrada e permanece fechada, nas mãos de um fiel depositário. Ninguém sabe o que teria sido discutido de tão importante naquela sessão secreta da Câmara
Por Salim Burihan
Em 1963, Caraguá era uma cidade pacata, com cerca de 15 mil moradores. Apesar de ser uma estância balneária, o turismo era fraco e a economia girava em torno da Fazenda dos Ingleses e da pesca.
A política, no entanto, fervia. O prefeito era Antônio Augusto Matheus; e, o vice, Avelino Ferreira. O presidente da Câmara era Otávio Patrício de Moraes.
A Câmara Municipal era formada pelos vereadores Antônio Nepomuceno(Totó), Benedito Paes Sobrinho, Euclides Ferreira, Geraldo Nogueira da Silva(Boneca), José Moraes Carvalho, José da Silva, Mário Magalhães, Osíris Nepomuceno Santana, Plínio Passos, Altamir Tibiriçá Pimenta.
Entre os suplentes que exerceram a vereança naquela época estavam Joaquim Pereira da Silva(Quincas), Dácio Augusto de Barros Filho(Dacinho), Florivaldo Pereira(Flor), Antônio Cruz Arouca e João Bento de Sousa.
A sessão secreta, que reuniu todos os onze vereadores, ocorreu no dia 23 de julho de 1963. A Câmara funcionava nas proximidades da Praça Cândido Mota, onde fica a Igreja Matriz de Santo Antônio. Foi uma reunião tensa e demorada, com muita discussão, mas o assunto permanece em sigilo até hoje.
Conseguimos apurar que o assunto daquela reunião era antigo, de 1961. Os processos tinham os números 644/61 e 645/61, mas nunca se soube do que se tratavam.
Alguns moradores mais antigos, ainda vivos, consultados, alegaram que na época ouviram boatos de que os vereadores pretendiam cassar um político dos mais atuantes na cidade, mas o motivo ninguém soube explicar.
Um dos moradores, disse acreditar, que a reunião secreta teria como objetivo investigar e apurar a possível má conduta de um político. O político, em questão, teria desrespeitado a moral e os bons costumes na época.
Ata
A ata da sessão secreta foi lacrada no dia 12 de dezembro de 1963 e entregue aos cuidados do tesoureiro da Câmara, Edmundo Lucaichus. Segundo orientação da presidência da Câmara, o documento só poderia ser aberto em outra sessão secreta.
Edmundo jamais teria aberto aquele envelope pardo, lacrado com fita crepe, para saber o que continha dentro. Sua responsabilidade era manter o documento fechado e guardado em sua casa.
Edmundo, já falecido, se aposentou na Câmara em 1986. Como não poderia mais ficar com o documento “secreto”, deixou o envelope com o supervisor administrativo José Mário da Silva, que também levou o documento para sua casa e o mantém “trancado a sete chaves” até hoje.
Procuramos o José Mário, mas ele se negou a falar sobre o assunto, informando apenas que mantém o documento até hoje lacrado, sem saber o seu conteúdo.
Ele disse que o regimento interno foi reformado em 1985 acabando com a realização de sessões secretas pela Câmara. Portanto, o documento jamais poderá ser aberto. O que registra aquela ata de 1963 permanecerá um mistério, segundo José Mário.
“A Câmara somente poderia abrir em uma sessão secreta, como essa possibilidade não existe mais, o documento jamais poderá ser aberto. É, na verdade, um documento histórico. Quando eu me aposentar, terei que entregar o documento para outro funcionário, que também terá como missão manter o envelope fechado e em segredo”, contou.
Segundo ele, uma das alternativas seria a câmara atual votar pela destruição do documento, sem abrir para saber o conteúdo da ata. “Se isso ocorresse perderíamos uma parte da nossa história política e iríamos contra a vontade dos vereadores, que se reuniram em 1963, naquela sessão secreta para tratar de um assunto muito importante naquela época”, afirmou.
Vereador
A ata com o conteúdo daquela reunião secreta permanece até hoje lacrada. Nunca foi aberta. Não se sabe o conteúdo. Como o José Mário, que mantém o documento, não sabe o que tem naquela ata, decidi pesquisar os vereadores que participaram daquela sessão secreta de 1963.
Somente um vereador que participou daquela sessão há 56 anos poderia explicar qual foi o motivo, o assunto tratado naquela reunião secreta. Será que algum vereador que participou daquela sessão ainda estaria vivo?
Achei. O único vereador daquela época ainda vivo é Dácio de Barros Filho. Ele, somente ele, poderia contar o que teria sido tratado de tão importante pelos vereadores naquela sessão secreta de 23 de julho de 1963. Todos os demais vereadores já faleceram.
“Dacinho”, como ele é conhecido mora em Santos. Ele se aposentou como advogado e vive naquela cidade, ao lado de sua mulher, dona Laura e dos filhos e netos. Consegui achar o Dacinho, hoje, com 82 anos de idade.
O ex-vereador conta que era suplente, mas assumiu o cargo substituindo o colega Osiris Santana, que se licenciou até o final daquele mandato. Dacinho se recorda da sessão secreta, segundo ele, muito tensa e demorada. Ele tinha 24 anos na ocasião.
“Lembro muito bem”, contou. Segundo ele, a reunião secreta era para cassar o mandato de um político muito conhecido na ocasião, mas ele em respeito ao político, já falecido e aos seus familiares, não quis revelar o nome e nem os motivos alegados para a sua cassação.
“Mesmo sendo oposição ao político ameaçado de cassação, eu entendia, na ocasião, que os motivos alegados não eram suficientes para afastá-lo do poder. O assunto, realmente, tinha que ser discutido secretamente, não poderia ser tornado público”, insistiu. Nem o nome de quem seria cassado ele quis revelar. Tudo indica, que a revelação do motivo da sessão, pois poderia abalar a família do envolvido e a classe política.
A família de Dacinho era muito influente na cidade. Seu sogro, Plínio Passos, foi vereador e presidente da Câmara. Era muito influente na política local. Dacinho, por sua vez, foi eleito vereador em 1960 e em 1992. Foi presidente do E.C. XV de Novembro, o principal clube da cidade e da região.
E, o mistério continua. Um documento histórico, cujo teor jamais será conhecido. Em 1985 a Câmara acabou com a possibilidade de se fazer sessões secretas, ou seja, o documento não poderá mais ser aberto.
Em 2012, uma nova decisão da mesa diretora determinou a duração em que os documentos do legislativo devem permanecer arquivados: requerimentos até cinco anos; projetos rejeitados, 10 anos; indicações, um ano; e, documentos relativos aos funcionários, 50 anos. Uma lei federal determina, que um documento público, não pode ficar arquivado por mais de 50 anos.
Qual fim terá a ata secreta de 1963? O documento não poderá ser cedido ao Arquivo Público Municipal, pois poderia ser aberto e, com isso, revelar um dos assuntos mais delicados envolvendo o executivo e o legislativo da cidade. O que teria sido discutido naquela reunião secreta de 23 de julho de 1963 permanecerá para sempre, tudo indica, como um grande mistério.
Bom dia a todos! Segundo fiquei sabendo, o segredo deixou de ser tão secreto!
“documento não poderá ser cedido ao Arquivo Público Municipal, pois poderia ser aberto”, essa informação não procede. Documentos podem ser classificados como “ostensivos”, onde qualquer pessoa pode ter acesso” e sigilosos. Em nenhum momento o Legislativo Municipal ou o jornalista procurou o Arquivo Público ou mesmo o Arquivo Municipal Arino Sant’Ana de Barros para falar oficialmente sobre o documento em questão, que poderia ficar sob a guarda do Arquivo Municipal por meio de convênio.